domingo, 13 de abril de 2014

Conversando sobre Climatologia - Entrevista com o Professor Manuel Calabar - Abril de 2014.

Bom dia Galera.

O Bioclima, neste início de mês de abril, vem publicar a segunda entrevista da série - Conversando sobre Climatologia, que agora recebe Manuel Calabar - Professor Visitante da Universidade Estadual de Feira de Santana. Leiam!!. Vocês irão gostar.

BIOCLIMA. Professor, eu perguntaria inicialmente sobre sua trajetória. Onde se formou, quais foram seus trabalhos de mestrado e doutorado e o que desenvolve atualmente. Até para que nossos leitores possam o conhecer melhor.

Eu fiz toda minha trajetória acadêmica na Universidade de Santiago de Compostela (USC), que fica na região da Galícia (Noroeste de Espanha). A cidade é bem conhecida aqui no Brasil pelo Caminho de Santiago, rota de peregrinação que popularizou Paulo Coelho com diversas publicações. Sou Graduado em Geografia (lá na Espanha se chama de "Licenciado"), e tenho Doutorado também pela USC. Inicialmente, nos estudos equivalentes ao Mestrado do Brasil, pesquisei sobre temporais de chuva e vento na Galícia, com uma proposta de classificação em função da intensidade e da periculosidade que combinou quantidade de chuva e rajadas de vento com o número de dias consecutivos que aconteceram.

Já no doutorado mudei de assunto e estudei a oferta e demanda de uso público em Espaços Naturais Protegidos também na Galícia, com aplicação de uma metodologia que utilizava indicadores para a oferta, e questionários a visitantes para a demanda. Meus orientadores foram os Professores Rubén Camilo Lois González e Alberto Martí Ezpeleta, os dois da USC. Durante o tempo que fez o Doutorado e depois de defender a Tese, trabalhei como pesquisador em um grupo integrado principalmente por geógrafos, colaborando em vários tipos de pesquisas desde turismo a geografia urbana. No ano de 2012 apareceu a oportunidade de trabalhar como Professor Visitante na Universidade Estadual de Feira de Santana para algum dos membros do grupo de pesquisa, e decidi aceitar este novo reto pessoal e profissional.


 A Professora Raquel Vale, Servidor Técnico Róbertson da Silva Carneiro e o Proff. Manuel Calabar (UEFS).

BIOCLIMA. Prof. Manolo, como nossos leitores são do Brasil, e o senhor agora está como Professor Visitante da Universidade Estadual de Feira de Santana. Você poderia nos falar das características da climatologia de Feira de Santana, situada a cerca de uma hora de Salvador, mas com um clima muito particular.

Você mesmo colocou as palavras certas: um clima muito particular. Aqui vou falar desde o ponto de vista de alguém que vem de fora por primeira vez e que morava antes em um clima totalmente diferente. Antes de vir para Feira de Santana, me informei das características gerais do Clima. O primeiro que me chocou foi a peculiar distribuição das precipitações ao longo do ano. Nas Latitudes Médias, nossos manuais de Climatologia falam de um reparto das chuvas nos Climas Tropicais com uma estação seca no inverno e uma chuvosa no verão, e Salvador (o exemplo que primeiro olhei) não acompanha nem o mais mínimo esse padrão pois os meses da chuva mais abundante vão de Abril a Julho. Só depois, aprofundando mais, foi que passei a entender que dependia de nuances com a Circulação atmosférica do Nordeste do Brasil, pelo menos em parte. Feira acompanha esta distribuição, mais com quantidades totais bem menores que em Salvador, e aqui vem a segunda questão. A característica mais "especial" para mim foi que a faixa de elevada pluviosidade era muito estreita, e que as isoietas diminuíam rapidamente de valor a pouca distancia do mar sem ter uma barreira orográfica que justificasse isto! Ainda é o dia de hoje que fica difícil ter uma noção exata de tal anomalia, compartilhada por quase tudo o Semiárido Nordestino, tão azonal e "particular" dentro dos Climas do Mundo. A pouco mais de 100 Km de Salvador (com médias de 2000 mm anuais de chuva), Feira se contenta com médias de 800 mm, no limite mesmo da semiaridez. De fato, Feira de Santana é chamada de "Portal do Sertão" ao ficar na faixa de transição entre o Clima Tropical Úmido do litoral e o Semiárido interior (chamado de "agreste"). A seca também se deixou notar aqui, em 2012 só foram recolhidos na Estação Meteorológica da UEFS pouco mais de 200 mm. Recorde histórico. Houve sérios problemas para os pequenos produtores rurais que ainda hoje dá para perceber, mesmo amenizando muito a situação com um 2013 bem mais chuvoso.



BIOCLIMA. A sua experiências em estudos de clima urbano vem da Espanha. O senhor poderia nos dizer em qual estágio da arte dos estudos de clima urbano na geografia espanhola?

Atualmente, os estudos de Clima Urbano deram uma parada sem um motivo concreto. Houve uma etapa de muito trabalho na década dos 1990 e primeiros anos do Século XXI, no que grande parte das cidades espanholas foram estudadas e muitas publicações saíram á luz. Existe, pois bastante trabalho feito e de ótima qualidade, mais seria bom atualizar os estudos, até porque as cidades espanholas experimentaram um crescimento importante no seu perímetro urbano por causa de um boom urbanístico especulativo muito intenso que explodiu em 2008 com a crise econômica. Os efeitos de este processo no Clima Urbano das cidades espanholas ainda não está bem estudado, na minha opinião.

Profa. Raquel Vale e Manuel Calabar observando um mini-abrigo

BIOCLIMA. Por ser morador da Galícia, por muito tempo o senhor nos descrever a climatologia desta região situada ao norte da Espanha.

A Galícia, por estar localizada num dos extremos Ocidentais da Europa, possui um Clima Temperado Oceânico, ou como muitos autores denominam, Temperado de Litoral Ocidental. Isto é, as temperaturas são amenas (sem grandes picos de calor e frio, por norma geral), e as chuvas são abundantes, principalmente no Semestre frio (Outubro-Março). Galícia fica na trajetória de passo das perturbações da Fronte Polar do Hemisfério Norte, e ademais influenciada pela Deriva Nor-atlântica, que aporta águas quentes incrementando a pluviosidade e amenizando as temperaturas. Com tudo, a Galícia fica no extremo meridional da área Oceânica européia, bem no limite com a área de influencia do Clima Mediterrâneo. Unido a isto, a região tem um relevo bem compartimentado, com numerosas serras e depressões. E por isto que em muitos locais do interior, os verões são quentes e secos, bem próximos do Mediterrâneo, e os invernos mais frios por continentalidade. As altas pressões subtropicais (Alta das Açores) influenciam fortemente no verão, dando tempo mais ensolarado que, por exemplo, a Irlanda, que fica em linha reta ao Norte da Galícia.


Professor Manuel Calabar - Professor Visitante da UEFS

BIOCLIMA. Além de professor visitante, qual pesquisa o senhor desenvolve em Feira de Santana-BA?

Meu trabalho prioritário na UEFS é ajudar a colocar em funcionamento um Laboratório de Climatologia, que auxilie os trabalhos de ensino, pesquisa e extensão da Licenciatura e do Bacharelado em Geografia. Além disso, coordeno um projeto de pesquisa que tem duplo foco: conhecer o estado da rede meteorológica que existe no Estado da Bahia (tipo de estação, localização das estações, dados coletados, período de coleta, instituição gestora), e verificar qual informação meteorológica chega até os pequenos produtores rurais do Semiárido, por que médios chega, se é utilizada e como, e se consideram útil essa informação no seu desempenho, aplicando questionários pessoais. Também ministro aula de Fundamentos de Climatologia na graduação, pois como Professor Visitante não posso ministrar mais de uma matéria. A gente está fazendo o possível para trabalhar com meios ainda precários, mas acreditando que passo a passo se faz caminho e que se aprende de tudo para melhorar. O contato com profissionais de outras universidades e instituições é de grande ajuda, e por isso também fazemos visitas técnicas a Laboratórios como o BIOCLIMA da UFV.

Equipe do Bioclima-UFV com os professores visitantes da UEFS.

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