Pesquisa investiga a percepção dos jovens acerca da evolução e compara resultados obtidos em escolas brasileiras e italianas. Ao contrário do esperado, a religião não apareceu como fator decisivo para a rejeição à teoria evolutiva.
Como a teoria da evolução é ensinada, aprendida e aceita nas escolas? Com essas questões em mente, uma equipe de pesquisadores decidiu investigar a percepção de estudantes de Ensino Médio acerca do tema, em escolas no Brasil e na Itália. Apesar de ser considerada uma das mais importantes teorias científicas, a evolução, como descrita por Charles Darwin e Alfred Wallace, ainda encontra resistência em alguns setores da população. De uma maneira geral, a religião é apontada como um dos maiores entraves para a compreensão e aceitação da teoria por parte dos alunos da educação básica. Para os pesquisadores envolvidos no levantamento, no entanto, essa resistência se deve a uma série de fatores e não à religião isoladamente.
Brasileiros e italianos são muito semelhantes em relação à espiritualidade: grande parte da população professa a fé católica nos dois países e a religião é vista como uma parte importante da vida em sociedade. Mas a vivência religiosa não é o único fator que influencia a percepção dos jovens sobre a evolução. Por isso, a pesquisa avaliou também outras variáveis, como gênero, escolaridade dos pais, renda familiar e contato com a ciência fora da escola.
Mais de 2,4 mil estudantes de escolas públicas e particulares de todas as regiões do Brasil, além de 3,5 mil italianos, responderam a questionários com perguntas essenciais sobre a teoria da evolução e a história da Terra. Os resultados evidenciaram que o estudante brasileiro possui dificuldades para se posicionar em relação a algumas questões, preferindo dizer que “não sabe” a ter que expressar sua opinião. O mesmo não acontece com o jovem italiano que, independentemente da religião, demonstra um maior nível de conhecimento sobre a teoria da evolução.
Organismos diferentes podem ter um ancestral comum, correto? Não para a maioria dos estudantes brasileiros que responderam ao questionário. Cerca de 51% deles disseram não saber se essa afirmação era falsa ou verdadeira. Apenas 29,8% dos brasileiros que participaram do estudo acreditam que a informação seja verdadeira, enquanto 61,6% dos participantes italianos concordam com a afirmação.
Para os pesquisadores que avaliaram as respostas, o motivo da discrepância entre os resultados brasileiros e italianos está mais relacionado à forma como o conteúdo é apresentado nas escolas do que a fatores externos. “O estudante italiano, já no Ensino Fundamental, possui noções mais claras sobre história do homem na Terra, macroevolução e microevolução”, diz a bióloga Graciela da Silva Oliveira, que fez deste seu projeto de doutorado na Universidade de São Paulo, sob orientação do também biólogo Nelio Bizzo. Os alunos brasileiros, por sua vez, não têm tanto contato com esses temas nos primeiros anos de escolaridade. “No Brasil, geralmente, esses conceitos são vistos em um período muito curto de tempo no Ensino Médio”, pontua a pesquisadora. Ao menos neste estudo, a religião acabou ficando em segundo plano. “Em alguns grupos pudemos perceber forte influência da religião – sobretudo de religiões mais novas, como as evangélicas neopentecostais. Mas, embora a religiosidade estivesse presente, não necessariamente levou à rejeição da teoria da evolução. Na maioria das vezes, o que falta é o conhecimento”, conclui Oliveira. A partir dos resultados, a bióloga defende uma alteração do currículo de Ensino Fundamental, para que a abordagem da teoria da evolução se inicie mais cedo e ganhe mais tempo.
Para Edson Pereira da Silva, biólogo da Universidade Federal Fluminense, mais do que as diferenças culturais entre os dois países, os dados de Oliveira ressaltam a diferença de informação que os estudantes possuem. Para ele, os problemas no ensino da teoria da evolução são os mesmos que permeiam o ensino de outros conteúdos. “Nosso problema é a falta de investimentos sérios e consistentes em educação”, argumenta. “Um investimento mais sólido talvez não mude o cenário de aceitação da teoria evolutiva, mas certamente modificaria o quadro de desinformação com relação a ela”.
Everton Lopes
Instituto Ciência Hoje/ RJ
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