Este
ano ocorrerá o XI Simpósio Brasileiro de Climatologia em Curitiba, no mês de
outubro. Vejam as informações no site da Abclima (www.abclima.ggf.br). E como
parte do trabalho do Laboratório de Biogeografia e Climatologia (Bioclima),
neste ano de 2014 procurará aprofundar as discussões climatológicas no cenário
nacional, tentando trazer para você, leitor, mais convidados para conversar
conosco. Iniciamos o ano de 2014, com a entrevista do Professor Doutor Emerson
Galvani do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo – USP. Boa
leitura e participe.
BIOCLIMA: Prof. Emerson Galvani, apesar
de ser morador da cidade de São Paulo, acredito que deva conhecer outras
regiões do Estado. E como no nosso blog tem leitores de diversas partes do
Brasil, gostaria que pudesse explicar as diferenciações climáticas que podem
ser encontradas no Estado de São Paulo.
PROF. EMERSON GALVANI - FFLCH- DG-USP |
E.G.
O estado de São Paulo pela sua posição latitudinal apresenta-se em uma faixa de
domínio climático de transição – entre os climas com características de
tropicalidade e aqueles com influência de climas extratropicais. É comum termos
verões (e primaveras) com temperaturas elevadas e outonos e invernos com
temperaturas reduzidas. A configuração longitudinal do estado de São Paulo
também é importante controle climático, pois temos áreas próximas ao Oceano
Atlântico – efeito da maritimidade e, áreas distantes do oceano, como o
interior paulista, onde os efeitos da continentalidade são mais perceptíveis.
Aliado a isso temos uma variação altitudinal significativa na região que compõe
as Serra do Mar e Mantiqueira, na divisa com o estado de Minas Gerais. Tenho o
hábito de comentar que o estado de São Paulo, torna-se mais seco (menos
chuvoso) e com temperaturas mais elevadas a medida que caminhamos para a
direção norte e noroeste do estado. No ambiente urbano temos ainda a
configuração do Sistema Clima Urbano onde o perfil de uso e cobertura do solo,
aliado as atividades humanas, é capaz de produzir significativas diferenças de
temperatura e umidade relativa do ar em relação ao ambiente não urbanizado
próximo.
BIOCLIMA: Em seu livro Climatologia
aplicada, destaca a importância dos estudos de caso. Qual a relevância e a
contribuição deste de estudo para a climatologia geográfica brasileira?
E.G.
Os estudos de caso, aqueles verticalizados e com áreas reduzidas de análise
baseado em dados empíricos primários, constituem importante linha de pesquisa
no contexto da climatologia geográfica. Esses estudos em que o pesquisador
consegue “tocar” seu objeto de estudo na escala de detalhe, 1:1, permite entender
algumas relações que passam despercebidos quando se trabalha com dados
secundários. Entender as partes e compor o todo parece-nos uma interessante
forma de abstrair os estudos que envolvem a atmosfera e suas interações com a
superfície. Na realidade é um jogo de forças e interações, esse nível escalar,
micro, topo, meso, está sujeito a energias de escalas maiores que também devem
ser considerados nas análises.
Prof. Emerson Galvani ministrando curso de clima e agricultura no DGE/UFV |
BIOCLIMA:. A algum tempo, o Senhor
desenvolve estudos relacionados ao clima do Mangue. Acredito que resultados
interessantes já deva ter encontrado. Neste sentido,
qual o significado climático do ecossistema mangue para os estudos de
climatologia geográfica.
E.G.
O ambiente de manguezal é ecossistema costeiro de transição entre o ambiente
terrestre e o ambiente marinho, condicionado, fortemente, pelo regime e atuação
das marés, ou seja, os manguezais só estão ali porque nenhuma outra espécie
vegetal tem competência para se adaptar a esse ambiente de águas salobras. O
mangue (quando me refiro a um individuo, uma árvore) e o manguezal (quando me
refiro ao conjunto de árvores do mangue) apresenta inúmeras funções, dentre
elas: proteção da linha de costa (após a ocorrência de grandes ondas ou
tsunamis é evidente o papel dessa vegetação na linha de costa); refúgios de
espécies marinhas, estuarinas e terrestres;
Filtro biológico, absorvendo e
imobilizando produtos químicos, inclusive esgotos; Fonte
de alimento e de produtos diversos, associados à subsistência de comunidades
tradicionais; Possibilita atividades de recreação e lazer, associado ao seu
alto valor cênico, entre outras funções. Os principais resultados das pesquisas
que desenvolvemos, no nível microclimático, tem evidenciado o papel da
vegetação – dossel – na atenuação e redistribuição de energia no interior desse
ambiente, proporcionando a manutenção e expansão da flora e da fauna que ali
habitam.
BIOCLIMA: Em publicado na Revista
Brasileira de Climatologia, o senhor aborda a influência da topografia na
distribuição das chuvas em Ilha ela. Apesar de poucos estudos, realizados no
Brasil, pode-se dizer que existam eventos episódicos, em que total pluvial
precipitado é maior em altitudes inferiores? Como se explica isso?
E.G.
Esse trabalho mencionado é resultado da dissertação de Mestrado do aluno Marcos
Milanesi defendido aqui no Programa de Pós-Graduação em Geografia Física da
USP. O objetivo do trabalho era estudar o efeito orográfico produzido pelo
relevo da Ilha de São Sebastião (município de Ilha Bela, SP). Foi um trabalho
árduo de monitoramento das precipitações durante um ano hidrológico (outubro a
setembro) com avaliações mensais do total precipitado. Os pluviômetros, seis no
total, foram instalados em um transecto com alinhamento leste-oeste,
iniciando-se na Praia de Castelhanos, passando pelo divisor a 690 m ANMM e
finalizando no centro de Ilha Bela. Os dados demonstram que a vertente a
barlavento precipita 60% e, a vertente a sotavento 40% do total do perfil
indicando uma “sombra de chuva” na vertente a sotavento. Esse efeito –
orográfico – é potencializado pela elevação da parcela de ar oriunda do oceano
– úmida. Para que esse efeito se manifeste é necessária à combinação de alguns
fatores: elevação significativa da parcela de ar condicionada pelo relevo,
presença de umidade, no caso do oceano mas esse efeito pode ocorrer em áreas
distantes do oceano e, persistência de ventos que forçam, mecanicamente a
elevação da parcela de ar. Respondendo sua pergunta é possível sim a ocorrência
de totais pluviométricos mais elevados em altitudes inferiores em alguns
eventos, isso dependerá do tipo de precipitação, convectiva, por exemplo,
contudo os totais anuais tendem a ser mais elevados em áreas com altitudes mis
elevadas e com condições físicas de estimular o efeito orográfico.
BIOCLIMA: Como a última questão. Gostaríamos
que o senhor, que já foi ex-presidente da Associação Brasileira de
Climatologia, nos apresentasse a sua visão do atual cenário da climatologia
geográfica brasileira.
E.G.
A ABClima tem se consolidado nos últimos anos como uma entidade forte e atuante.
Fui secretário da associação da gestão 2006 a 2008 sob a presidência do
professor Dr. José Bueno Conti e entre 2008 a 2010 atuei como presidente da
entidade. A ABClima tem se sustentado em duas vertentes: A Revista Brasileira
de Climatologia (já com 13 volumes publicados) e os Simpósios Brasileiros de
Climatologia Geográfica (caminhando para a XI edição). Isso, sem dúvida, indica
que a entidade está consolidada no meio científico nacional. A perspectiva
futura, no meio olhar, é cada vez mais consolidarmos o SBCG, convidando novos
colegas e integraram as mesas e as conferências do evento e enviando artigos
para a Revista, somente assim, com a participação cada vez maior dos
pesquisadores e grupos de pesquisa é que teremos, ainda mais, o fortalecimento da
ABClima.
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