Nas últimas semanas fomos bombardeados por notícias vindas de todas as partes sobre a possibilidade do El Niño de 2015 ser o mais forte da história. A OMM (Organização Mundial de Meteorologia) ligada à ONU, divulgou em seus relatórios que o fenômeno será o mais forte dos últimos 15 anos e deverá ter seu apogeu nesse mês de dezembro. Para entender essas afirmações é importante ressaltar que em 1997 as temperaturas das águas na região central do Oceano Pacífico atingiram valores 2,5°C acima da média e no mês passado esse valor chegou a 3,0°C. Porém, na média do trimestre (outubro/novembro/dezembro) o valor está 0,2°C abaixo do registrado no mesmo período de 1997. Isso seria um sinônimo de que o El Niño deste ano não será o maior da história, mas sim, o maior dos últimos 15 anos.
Mas quais os verdadeiros impactos que esse El Niño irá trazer para a agricultura e para a população urbana? Independentemente se ele será o mais forte da história ou dos últimos 15 anos, os impactos serão os mesmos em todo o planeta. Mas, antes de mencioná-los é necessário esclarecer que o El Niño de 2015 não começou na primavera, sua influência sobre o clima foi percebida desde o final do verão desse ano.
Globalmente, o El Niño intensifica os extremos, ou seja, deixa a região chuvosa com mais chuvas, e as regiões onde normalmente são secas, com a estiagem mais agravada. Além disso, os efeitos são diferentes em cada região do planeta. Na Ásia e na Oceania a tendência é de pouca chuva e temperaturas mais frias. Na parte sul da América do Sul e norte da América do Norte a tendência é de chuvas acima da média. Já na faixa central das Américas a tendência é de chuvas abaixo da média e temperaturas extremamente altas. Isso explica porque chove muito no Sul, enquanto em toda a faixa central e norte do Brasil as chuvas estão irregulares e há até mesmo um período mais seco em algumas localidades.
Houve quebras na produção de culturas de trigo e milho da Rússia, Ucrânia e China, do arroz da Tailândia e Vietnã e da cana de açúcar na Índia, além das quebras na produção de açúcar em países da América Central. Tudo isso, por conta da ausência de chuvas regulares e em bons volumes. Já nos Estados Unidos e Canadá a chuva acima da média e regular favoreceu a produção e com isso houve uma excelente safra. Enquanto no Brasil, chuvas acima da média no Sul destruíram as produções de trigo.
Mas e daqui para frente, o que se pode esperar do El Niño ? Independente da sua intensidade seus efeitos já estão sendo sentidos e continuarão nos próximos 60 ou até 90 dias. Assim, o que já vem ocorrendo não irá mudar muito. O Sul vai continuar com muita chuva, precipitações regulares, frentes frias que passam frequentemente sobre a região e provocam chuvas acima da média em todas as microrregiões sulistas, incluindo nesse bloco a faixa sul do Mato Grosso do Sul.
Já em todo o Sudeste, Centro-Oeste, MATOPIBA e Pará as chuvas continuarão irregulares, como já vem ocorrendo. E as áreas que mais irão sentir os efeitos negativos do El Niño serão o semiárido e o sertão nordestino, pois nessas regiões a tendência é que as chuvas fiquem mais fracas e espaças, e agravem ainda mais a condição de seca.
As chuvas acima da média no Sul irão resultar numa condição muito boa para a produção agrícola, mas por outro lado, irão manter as condições bastante favoráveis à proliferação de doenças, por isso, já são observados focos de doenças nessa região, bem antes das demais e isso poderá ser um entrave na produção agrícola. Uma vez que chuvas mais regulares também dificultam a aplicação de defensivos.
No Sudeste e Centro-Oeste chuvas muito irregulares dificultam as tomadas de decisões dos produtores. Mas de certa forma, como há essa forçante para chuvas, elas irão ocorrer, mas de forma muito irregular, ora chove numa parte do município, ora noutra. Até mesmo dentro de uma única propriedade poderá ser sentida essa irregularidade. Mas uma coisa que ninguém conta é que independentemente do fenômeno climático e da sua intensidade, esses não influenciam o clima durante o verão no Sudeste e Centro-Oeste. As regiões sul do Oceano Pacífico e todo o Atlântico tem um peso muito maior sobre o regime de chuvas do que a região Equatorial do Pacífico. E segundo os modelos de previsão poderão vir a ocorrer bloqueios atmosféricos sobre essas regiões devido ao aquecimento muito acima da média do Pacífico Sul. Assim, nada impede que a segunda quinzena de janeiro e os primeiros dias de fevereiro possam ser mais secos.
No MATOPIBA, para uma análise mais precisa é necessário dividir a região, o oeste da Bahia, assim como o Tocantins terá chuvas mais regulares e um pouco abaixo da média, já no Piauí e leste do Maranhão poderá ter um período mais seco do que as demais regiões, uma vez que choverá muito no Sul do Brasil, vão faltar precipitações no Norte. Não há como chover bem nos dois extremos do Brasil ao mesmo tempo, infelizmente. Com isso, não só o sertão nordestino como também essas duas regiões irão ser a mais impactadas pelo El Niño. Assim, chuvas irregulares irão ocorrer tanto no sertão nordestino quanto no Piauí e leste do Maranhão, e podem gerar perdas significativas nessas regiões. O agravante é que essas localidades já tem um histórico de 4 anos de perdas.
Marco Antonio dos Santos é agrometeorologista, graduado como engenheiro agrônomo pela Faculdade de Agronomia e Zootecnia Manoel Carlos Gonçalves, mestre em agrometeorologia pelo IAC, doutor em agrometeorologia pela ESALQ e consultor no segmento agrometeorológico para as empresas: de insumos, trades e bancos. Desde 2008 é colaborador da Somar Meteorologia.